quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Vila Santa, Unijorge e a falta de responsabilidade social

Estive há poucos minutos na Vila Santa, uma invasão que existe há 40 anos, desde que a sua fundadora, Dona Santa, hoje com 81 anos, chegou no local com o marido e os filhos. Atualmente, o lugar caminha para virar bairro. Pelo menos 400 pessoas moram por lá, o número de construção de casas tem aumentado significamente, há dois bares, embora ainda falte um mini-mercado e a tendência aponta para uma expansão.
Mas muitas coisas faltam na Vila Santa.
A localidade, que curiosamente está ao lado da Unijorge - uma Instituição de Ensino Superior dotada de um considerável mercado entre as IES privadas-, com cerca de 11 mil estudantes, a maioria de classe média, que pagam em média R$ 700 mensais, tem uma única via de acesso, uma espécie de labirinto, dividido justamente pela cerca de um dos estacionamentos do centro universitário.
Defronte à vila, há uma lagoa cercada de mato, muito mato... Quando chove, a lagoa ultrapassa a altura do mato, provocando pequenas enchentes, que invadem boa parte das casas. Detalhe: segundo Dona Santa e os demais moradores, a lagoa é habitada por famílias inteiras de jacarés, sucuris, ratos e, é claro, as singelas e abundantes muriçocas, afinal, mato que é mato, tem de ter muitas muriçocas, nada mais natural.
Mas a colega Michelle Brazil e eu ficamos intrigados mesmo com uma informação de uma das moradoras do local: imaginem que o esgoto da Unijorge vai dar justamente aonde? Sim, na Vila Santa, mais precisamente, em um terreno onde estão duas casas e mora uma criança de colo. O esgoto está a céu aberto e é despejado no pátio dessas famílias. O odor, talvez não fosse necessário dizer, é insuportável e a podridão dos dejetos jogados ali tem causado doenças, como infecções.
Eu sempre tive curiosidade sobre a Vila Santa. Passava direto pela Paralela, olhava para aquele lugar e ficava pensando: como é que as pessoas de lá sobrevivem? Encorajei Michelle a me acompanhar para passar a tarde desta quarta-feira conversando com os moradores daquele local quase que inacessível. Criado em um bairro suburbano, sempre soube que não devemos acreditar nos estereótipos, e que, geralmente há mais honestidade e beleza em lugares como este, do que nos apartamentos de luxo da Pituba, da Graça ou de Vilas do Atlântico.
Poucas vezes fomos tão bem recebidos. Percebemos que a carência maior daquelas pessoas não é por cestas básicas, materiais de construção, legalização da água potável ou criação de vias de acesso menos humilhantes. Eles são carentes de calor humano, gente que aceite sentar alguns minutos num daqueles banquinhos de madeira, tomar um cafezinho preto com eles para ouvi-los, simplesmente, unicamente, ouvi-los.
Mas eu estou muito incomodado com a Unijorge, onde, aliás, estudo. Não nego e jamais vou esquecer que todas as portas para o meu presente e futuro profissional foram abertas aqui, nesta academia. Agora, isso não me impede de atentar para algumas coisas que não deveriam acontecer. Cadê a responsabilidade social da Unijorge? Este centro universitário não se gaba tanto de ter uma parceria com uma instituição norte-americana conceituada, que investe aqui dentro? Será que a Unijorge não deveria auxiliar mais esta comunidade vizinha, em vez de prejudicá-la, como está fazendo? Por que os estudantes da área de saúde não fazem projetos para ajudar essas pessoas? E os engravatados do Direito, estão estudando leis que atendem a quais interesses? E os de jornalismo, onde estão? Por que têm medo de entrar na Vila Santa? Preferem eles as salas refrigeradas com ar-condicionado e cadeiras estufadas?
Eu gostaria de ter algumas dessas respostas. Vou ainda hoje a Ouvidoria da Unijorge denunciar o que vi. Se nenhuma providência for tomada, irei entrar com uma queixa-denúncia no Ministério Público Estadual (MPE) nos próximos dias, vou fazer de tudo para mobilizar os meios de comunicação, enfim, vou fazer alguma coisa.
Alguém precisa explicar essas coisas que todo o mundo finge que não vê.

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