terça-feira, 7 de julho de 2009

No buzú: escambo na era do capital de giro e empreendedorismo digital

Foto: ianpozzobon


Por Carlos Eduardo Freitas* [cadusongs@yahoo.com.br]


A barba e o cabelo por fazer já o entregavam. Havia algo de errado. Aparência truculenta e sisuda converter-se-ia, em instantes, em uma postura de fragilidade e abnegação. Aquele homem, mais um anônimo desses que pedem esmolas em ônibus, diferenciara. A inovação não parecia ser uma estratégia de marketing, mas uma humilhação daqueles que têm que dar a própria dignidade, em troca de uns trocados, para sustentar a família.


Logo no discurso ele surpreendera. “Gente, entendo que é chato para vocês ouvir logo cedo alguém pedindo no ônibus, sei que vocês estão cansados de saber que tem muitos que fingem que são aleijados, desempregados. Mas, no meu caso é diferente. Eu não peço dinheiro. Graças a Deus tenho dois braços fortes para batalhar por meu sustento. Se vocês estiverem precisando de alguém para carregar areia, arenoso, fazer qualquer serviço, por favor me deem essa oportunidade” – ia comovendo os passageiros.


Ele surpreendia ainda mais: “Se vocês não puderem me pagar com dinheiro, por algum serviço que estejas precisando que eu faça, eu aceito alimentos não -perecíveis em troca do meu trabalho”.


Com voz trêmula, o homem exibia a carteira de trabalho, velha, na qual expunha o carimbo do cadastro do SineBahia - uma espécie de agenciador de empregos do Governo do Estado - que lhe dá esperanças de arrumar um bom emprego. Dentro da carteira de Trabalho o homem trazia também as carteiras de identidade dos seis filhos que tem. “Tento sair mais cedo de casa, para que meus filhos não me vejam retirar-se sem tomar café, para que fique algo para eles comerem, mas sempre tem aquele que não dorme direito à noite e acaba vendo. Isso me dói, ver a reação deles” – desabafava o pobre homem.


Não teve quem não ajudasse. Mas, como nós que vivemos abaixo da linha do equador adoramos a facilidade que o capitalismo nos traz, o homem saiu sem um emprego arranjado, mas com um bom trocado no bolso. Digamos que cerca de 90% dos passageiros deram dinheiro a ele - e não foram moedinhas não! Teve até uma senhora que disse: “Estou indo ao mercado, meu filho, se quiser me acompanhar, compro umas coisas para você”. O homem, grato pela solidariedade que lhe foi declinada, respondera: “Sim, eu vou”!


*Carlos Eduardo Freitas é jornalista e colabora com este Blog desde janeiro de 2009.


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