segunda-feira, 10 de agosto de 2009

"Meu pai era um visionário"*


Jorge Emanuel Reis Cajazeira nasceu em Salvador, Bahia, há 41 anos. O engenheiro mecânico com PHD em Administração de Empresas e Sustentabilidade trabalha na Suzano Papel Celulose há 17 anos, onde atualmente ocupa um cargo executivo, além de ter sido eleito, em 2004, presidente mundial do comitê de elaboração da ISO 26000 – Responsabilidade Social, que atua em 50 países e 60 organizações.
Meus pais não tiveram grande instrução nos estudos. Na verdade, eles não tiveram nem oportunidades para estudar. Meu pai era militar da Marinha do Brasil. Minha mãe teve instrução primária, apenas. Mas eles sempre me apoiaram muito nos estudos. Eu estudei no colégio Marista, num tempo em que aprender inglês era praticamente um capricho. Naquela época, “sobreviver” no mundo não exigia a obrigatoriedade do da língua estrangeira, mas veja, que mesmo assim, meu pai sempre fez questão que eu estudasse inglês desde cedo. Hoje eu vejo que, nesse sentido, meu pai era um visionário. Já pensou aonde eu chegaria sem estudar inglês? (risos)

Lembro que eu tive uma infância tranqüila, ali na região da Barra-Avenida. Eu fui criado ali. Eu sou natural de Salvador, inclusive. Meus pais é que vieram do Recôncavo. Meu pai era Cachoeira, já a minha mãe nasceu em Castro Alves.
Formei-me em Engenharia Mecânica, na Universidade Federal da Bahia. Depois disso, fiz mestrado e sou agora PHD em Administração de Empresas com ênfase em Sustentabilidade. É claro que eu não nasci sabendo o que é necessário saber a respeito desse tema. Estou há 17 anos na Suzano e, desde então, tenho me aprofundado cada vez mais no assunto, aprendendo mesmo, desenvolvendo essa especialização.

Se a Suzano não tivesse esse perfil de empresa responsável socialmente, certamente eu não estaria lá. Por que eu digo isso? Porque seria uma tremenda incoerência. Você não pode ter este perfil numa empresa sem ética alguma. Por isso é fundamental você ter o conhecimento de como funciona a filosofia, o pensamento da corporação. A Suzano tem origem judia. Foi uma família de judeus russos que a fundaram. Bem, normalmente os judeus têm no DNA esse quê de solidariedade, de retidão quando o assunto é o comportamento ético, certamente por causa de todas aquelas atrocidades que eles sofreram durante o nazismo. Então eles já começaram a empresa nesse clima de Responsabilidade Social Empresarial e eu fui me adaptando a isso. Eu não poderia ser um executivo focado nesse tema sem o aval da empresa. É isso.
Eu penso que a Responsabilidade Social Empresarial (RSE) é uma tendência e uma realidade. Senão, repare: qual é a empresa que resiste sem ela? Qual grupo tem resistido? A empresa que quer ser perene e permanecer como tal no mercado tem que ser ética e transparente com todos os públicos que se relaciona. Um exemplo é o meu Esporte Clube Bahia... Há quantos anos ele é mal gerido? Chegou ao ponto que chegou. Um time grande como o Bahia só fez cair, infelizmente. O Flamengo também é um bom exemplo. Há quantos anos esteve para cair para a segunda divisão. Agora vive um melhor momento. Por quê? Por causa de uma boa gestão. Quem não reconhece a RSE e permanece com uma postura antiética diante da sociedade pode até ganhar muito dinheiro em pouco tempo, mas não será perene. Vai cair. Vai acabar.

Confesso que penso em voltar para a Bahia, que é a minha terra. Eu acho que todo o mundo é mais ou menos assim, tem esse desejo de voltar um dia para o lugar de origem. Hoje estou aqui em São Paulo. Faço essa ponte aérea quase que todas as semanas, porque a minha esposa, meus filhos se mudaram há cerca de um ano para Salvador. Então, eu estou aí direto. Tem muitas coisas que me entristecem em Salvador. Eu observo muito a miséria. Vejo famílias inteiras nas sinaleiras. Isso é muito ruim. É muito triste. Há pouco tempo, levei um amigo meu norte-americano para conhecer o Pelourinho. Logo que chegamos, fomos surpreendidos por uma série de vendedores de sei lá o quê, que só faltaram agarrá-lo para oferecer seus produtos. Ele ficou apavorado. Não é para menos. Então, falta este tipo de preparo para a cidade. Eu fiquei envergonhado. Imagine a minha situação, tentando explicar para ele que, na verdade, são vendedores...
A ISO 26000 tem avançado muito. As discussões em todo o mundo caminham para uma linguagem comum e isso é muito bom. É legal também o patamar que o Brasil chegou nessa discussão. Antes, nós, os países em desenvolvimento, fazíamos a conta para que os países desenvolvidos pagassem... Era mais ou menos por aí. Hoje não. Nós estamos dando as cartas, somos protagonistas nessa discussão. Isso é muito importante.
*Entrevista que me foi concedida em novembro de 2008, publicada no portal EcoDesenvolvimento.org

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