terça-feira, 24 de março de 2009

Crônica de um folguedo charlatão - Gentes in Lugares

Por Carlos Eduardo Freitas*

O cenário é o mais inóspito possível. De um lado ouve-se uma insistente canção evangélica, um som estéreo que ressoa de um microssistem improvisado, do vendedor ambulante de CDs piratas: “Entra na minha casa, entra na minha vida, mexe com minha estrutura...”. Do outro lado a senhorinha, de lenço na cabeça, oferecia uma pomada para curar reumatismo, aos berros. Mais bancas de camelôs, mais gritaria, mais música – agora, um arrocha brochante!


Toda essa miscelânea era recheada por centenas de transeuntes que, para cima e para baixo, deixavam as escadarias da Estação da Lapa, sentido avenida Joana Angélica, muito mais congestionada. Mas algo se destacava. Talvez pela esperteza. Há quem diga que “pelo charlatanismo”. Este que vos escreve sente arrevelia só de pensar. O que seria então tal cena?


Um homem bem eloqüente e veloz no movimento das mãos, aparentemente solitário, vai ziguezagueando três conchinhas de metal. Em uma delas há uma pequena bola preta, de borracha. O palco para tal apresentação circense, às avessas, é um tabuleiro improvisado com caixas de papelão. Com cédulas de R$ 50 em uma das mãos o famigerado apresentador-ilusionista-espertalhão vai chamando a atenção das vítimas – digo: espectadores-participantes-voluntários. “Quem vai casar cinquentinha aqui?


Quem descobrir em que concha está a bolinha preta ganha R$ 100”. Como dimdim é uma linguagem universal, ainda mais quando há a possibilidade de obtê-lo com facilidade, o resultado não poderia ser diferente: em minutos, o tabuleiro está cercado de curiosos apostadores. Coitados, não sabem o que está por trás dessa “distração”! Para os desatentos, lamento informar, mas este truque esconde uma verdadeira quadrilha de extorsão, que atua em locais aglomerados, na grande Salvador.


O cara que chama atenção conta com o apoio de dois comparsas que ajudam a driblar a atenção dos apostadores, arriscando enormes quantias e convencendo a vítima a apostar também. Eles sempre indicam a concha errada. Aqueles que se concentram e acertam a concha onde está a bolinha correm o risco de serem assaltados, tão logo se afastem da roda de curiosos.


É que tem mais dois comparsas que ficam à parte, vigiando, esperando as cobaias sortudas. Acreditem caros internautas. Isto não é um conto. É uma crônica que até foge ao meu estilo literário suave. Mas, em tempos de crise financeira internacional (olha ela de novo!), todo cuidado com nosso pobre dinheirinho é pouco.


*Carlos Eduardo Freitas é jornalista, assessor de imprensa da Associação dos Gestores Governamentais do Estado da Bahia e colaborador deste blog desde janeiro de 2009.

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